Ana Vífer

Ana Vífer

quinta-feira, 26 de junho de 2014

A verdade sobre o perdão.

É preciso fazer a coisa acontecer de verdade... o tal do perdão.
É uma palavra bonita, proveniente de Deus, curadora, e em tese é fácil, mas não é não. Na hora do vamos ver não é, não é mesmo.
Eu inventei muitos "perdões", mil perdões, eu inventei mesmo. Mas não senti realmente.
Eu fingi que apaguei da memória e em alguns dias eu realmente não senti que havia qualquer vestígio de amargura e rancor, mas quando confrontada com o meu eu, eu vi que eu ainda cultivava por puro orgulho as deliciosas sementes da autopiedade e da autoproteção como se eu fosse um ser que não merecesse suportar e perdoar as falhas dos outros, afinal de contas, eu sou ou não sou perfeita? Eu sou... só que não, definitivamente não.
A mágoa tira folga com a vida que levamos, ela tira folga nos momentos de alegria e de preocupação. Em meio a correria ela desaparece, mas basta bater de frente com quem te deixou magoado que tudo vem à tona. Às vezes sutilmente, sorrateiramente em meio a uma brincadeirinha com fundo de verdade, em meio a um passeio pelo facebook, na timeline aquela pessoa te causa aversão ou raiva, sentimento de traição ou uma indiferença mortal.
Para perdoar é necessário primeiro entender que somos todos errantes e que todos um dia magoamos alguém e que não somos seres intocáveis fechados em uma redoma de dózinha... "ai coitadinha de mim, tão boazinha, tão amiga e levei uma facada...". Balela, se ainda não ferimos alguém, talvez, com "mais pra sim do que pra não" faremos alguém ficar triste.
Para perdoar é necessário entender que aquela pessoa talvez jamais se arrependa e como nós ela pode estar se sentindo com razão e atingida.
Para perdoar é necessário deixar de ser implicante, de ver pelo em ovo, de maldar, de xingar, de praguejar, de repelir e principalmente de cultivar aquele ódiozinho gostoso, que faz cócegas no ego deixando aquela frase pairando no ar: "eu tenho direito".
Sim, perdoar é mais do que tudo querer bem a si mesmo, ter coragem de querer bem ao outro de novo mesmo ele não merecendo e mesmo ele podendo fazer a mesma coisa ruim novamente. Será que é possível perdoar?
Não digo que vá pegar na mão e enfiar dentro de casa como se nada tivesse acontecido, isso é amnésia, não é interessante para ninguém se esquecer, mas é interessante para todos decidir por deixar que essa memória cicatrize por inteiro. Como um dedo cortado de fora a fora que teve que ser costurado e enfaixado, que trouxe dor, mas que agora é só mais uma cicatriz que doeu, mas não dói mais.
Eu mesma tenho uma cicatriz no dedão por cortar o leite com uma faca afiada demais para essa tarefa e por não saber manusear a faca... Eu mesma tenho uma cicatriz no coração por ter tido pessoas em minha vida que eu achava que conhecia que eu não soube introduzir na minha história e que me machucaram. Hoje essas pessoas estão suturadas e cicatrizadas, sem trauma, sem dor... só lembranças de um dia que passou e não tem que ficar voltando para despertar em mim sentimentos, comportamentos e conceitos que eu mesma reprovo, que eu não gosto.
Sei, e como sei que ainda há lixo tóxico e entulho para ser retirado da minha vida, há quem perdoar e existem pessoas que eu terei que perdoar todos os dias, da mesma maneira que pode-se amar diferente todos os dias, terei que perdoar com intensidades diferentes todos os dias.
Difícil, né? Também acho... Acho até que seria mais fácil virar um ser duro, frio, de ferro, pronto para revidar cada soco e cada pontapé, mas eu acho que ser assim é ainda mais desprezível do que ter que sofrer um pouco para enfim, aprender a lidar com os meus próprios ferimentos, sará-los e tocar minha vida.
Concluo que o perdão só pode acrescentar em mim, me deixar livre. O perdão é lindo porque ele é conquistado por você, como uma maratona em que se chega por último, mas por fim se chega... às vezes não tem medalha, mas tem honra por conseguir correr até o fim.